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Escolas da Zona Sul aderem à mobilização contra privatização administrativa de instituições de ensino no RS

Marcelo Passarella


Parecer de escritório Rogério Coelho sobre modelo que está sendo implementado no estado aponta conflitos com relação à Constituição e Lei de Diretrizes e Bases (LDB)


Um passo fundamental contra a privatização administrativa de escolas gaúchas foi dado no início deste mês de setembro. Equipes diretivas e professores das escolas estaduais de Ensino Fundamental José do Patrocínio e Ildo Meneghetti se reuniram com o objetivo de reforçar a contrariedade em relação ao projeto de implantação de Parcerias Público-Privadas (PPP´s), proposto pelo Governo do Estado. O encontro ocorreu no dia 04, na sede da escola José do Patrocínio, no bairro Restinga, em Porto Alegre.


O evento organizado em conjunto pelas duas escolas e o 39º núcleo do Cpers apresentou aos docentes as principais características do projeto, que visa conceder à iniciativa privada a gestão da parte administrativa de 99 escolas gaúchas por um prazo de 25 anos. De acordo com a proposta, serão leiloados três lotes de 33 escolas para empresas que terão a atribuição de efetuar reformas, ampliações, alimentação, vigilância e prestação de serviços de forma independente, a partir da solicitação das direções e sem o intermédio da Secretaria Estadual de Educação (Seduc).


O valor total do contrato é estimado em R$ 4,8 bilhões e abrange 33 escolas da Capital. Dessas, 21 estão situadas na região de abrangência do 39º núcleo do Cpers. Para a diretora geral do núcleo, Neiva Lazzarotto, a implantação das PPP’s não passa de mais uma tentativa do governador Eduardo Leite (PSDB) e da secretária de educação, Raquel Teixeira, de terceirizar as responsabilidades e enfraquecer a mobilização das comunidades escolares.


Neiva explica que o projeto está sendo colocado em prática para privatizar a educação e desarticular as comunidades escolares – que estão apenas sendo informadas dos atuais trâmites da proposta e não foram chamadas para construir o projeto em conjunto. Na única audiência pública realizada pela Seduc para apresentação do projeto, no dia 6 de agosto, Raquel Teixeira sequer permaneceu até o final do encontro para ouvir as demandas dos representantes das escolas, o que foi motivo de indignação dos professores.


Ainda segundo Neiva, se os gastos previstos fossem aplicados diretamente nas instituições de ensino, o valor anual concedido seria aproximadamente R$ 500 mil, recurso bem acima do que normalmente é repassado para as escolas. Além disso, ela aponta que é falsa a afirmação de que as empresas irão se dedicar somente às “atividades não-pedagógicas”, uma vez que todo o conjunto de atividades realizadas no interior das escolas está relacionada com a aprendizagem.


“Tudo o que ocorre nas escolas tem a ver com o ensino-aprendizagem, desde a merenda até a monitoria. Não é possível separar uma coisa da outra. Se o Estado acha que é possível ter R$ 4,8 bilhões para o setor privado, naturalmente isso poderia ser investido nas escolas e não contar o lucro que a empresa terá com essa concessão”, avalia.


Além disso, a dirigente salienta que os atuais funcionários contratados que atuam nos setores abrangidos pela reforma terão alta probabilidade de serem demitidos.

“Não tendo necessidade de ser remanejado para outras escolas da rede, eles serão dispensados. Não podemos permitir que isso aconteça”, informa Neiva.


A empresa responsável pelo projeto de concessão é SP Parcerias, que desenvolveu iniciativas similares em São Paulo. A previsão é que o edital seja publicado em dezembro deste ano e a estimativa é que o leilão ocorra em fevereiro de 2025.


Professores e diretores planejam calendário de mobilizações


As dezenas de representantes das escolas que se reuniram em uma das salas de aula da Escola José do Patrocínio destacaram os principais riscos que o projeto apresenta, diante da possibilidade de que hajam interferências no projeto pedagógico e dificuldades de encaminhamento de demandas e outras reformas simples nas estruturas das instituições de ensino.


Ao longo das próximas semanas, serão formados grupos junto aos Conselhos de Pais e Mestres e comunidades escolares, buscando realizar manifestações para ampliar a adesão de moradores e impedir que a concessão seja efetuada.


Já a diretora da José do Patrocínio, Carla Costa Machado, explica que as reuniões com os conselhos escolares terão o objetivo de mostrar que essa iniciativa parte de um sucateamento planejado das instituições públicas de ensino – para facilitar que o setor privado seja beneficiado com verbas que deveriam ser aplicadas diretamente na educação.


“Tem muitas coisas por trás desse projeto que os pais e comunidade devem entender. Esse projeto não esclarece como questões de manutenção simples podem ser resolvidas e não existe uma garantia que a empresa vai cumprir com suas responsabilidades. A gente sabe que no papel eles apresentam de um jeito, mas na prática é bastante diferente”, destaca.


A professora de Biologia da Ildo Meneghetti, Silvana de Souza, corrobora esse temor que consiste na precarização das escolas. “Na Jornada Pedagógica, fizemos uma reunião para debater a implantação das PPPs. O governo não manda verba para reparos e para manutenção predial como deveria, e faz parecer que colocar as escolas na mão da iniciativa privada é melhor. A lógica é precarizar para privatizar”, afirma.

Para o professor de Filosofia da Ildo Meneghetti, Diego Nunes, o governo Leite está fazendo uso indevido da legislação do Plano Rio Grande – criado para atender à emergência ambiental no estado após as enchentes – para privatizar o ensino gaúcho e escoar esses recursos para o setor privado.


“Depois da enchente, Leite aproveitou para incluir essas privatizações no Plano Rio Grande, algo que não deveria ocorrer. Esse projeto está sendo conduzido pela Secretaria de Reconstrução Gaúcha e visa gerar lucros com o dinheiro da educação. É uma farra legalizada com o dinheiro público”, salienta.


O professor da Escola José do Patrocínio, Roger Pereira, explica que os encontros vão buscar descrever os prejuízos que o projeto vai trazer para a comunidade.

“Vamos elaborar aulas públicas para mostrar às comunidades a importância da participação e denúncia desse projeto privatista do governo Leite”, comenta.


Modelo contraria Constituição e pode ser judicializado, aponta parecer jurídico


O modelo que está sendo implementado no Rio Grande do Sul é similar ao projeto deflagrado no Paraná neste ano, a partir da aprovação da Lei 22.006/24. Chamado de Programa Parceiro da Escola, o projeto transferiu 204 escolas públicas estaduais para a iniciativa privada. Contudo, um parecer do Escritório Rogério Coelho aponta que a Lei paranense contraria a Constituição e a própria Lei de Diretrizes e Bases (LDB).


O parecer assinado pelos advogados Filipe Ferreira Delmondes, Beatriz Lourenço Mendes e Karine Vicente de Matos chega à conclusão que a lei "usurpa a competência da União para estabelecer normas gerais sobre o tema da educação. Tais inconsistências comprometem a gestão democrática, a qualidade do ensino público, e a autonomia escolar, além de violar os direitos dos profissionais da educação.


Assim, é possível que a questão seja judicializada aqui no RS com base nessas mesmas diretrizes. O escritório também presta assessoria jurídica para o 39º núcleo do Cpers.


Galeria de Fotos



Fotos: Christoffer Dalla Lana

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